Dizem por aí...



É carnaval, meu caro!

É preciso saber qual sua fantasia para nesta tal alegria você entrar.
Não fique de fora, acabou tornando-se moda, esse tal de carnaval.

Agarrou o calendário, perambulou nada solitário, aprov
eitando a benção estatal.
Agora é moda e comum, entre na roda e finja que é tudo normal.


Se não tem samba no pé também é assegurado o seu lugar.
Existem aqueles que amam a cuíca pelas proezas do financiar.
Mas sente-se e aprecie sem moderação com esperteza e sem coação.
Desejo boa sorte, a cena é forte. Aqui não se teme tampouco a morte.

A comissão de frente é composta por bailarinos vestidos de bobos.
Da corte, a ralé. Coreografados pelo marqueteiro, tolos.
Dão as boas vindas, maquiados para a primeira impressão do povo.
Fantasiados de laranjas, buscando em algum El Dourado o ouro.

O carro abre alas comove. Há um grande polvo. Tentáculos são nove.
Grandes pastas. Bolsas aladas. Pessoas empregadas. A nata da satisfação.

Padrinhos contentes, afilhados eficientes, um sonho de organização.
E o letreiro luminoso, com o nome da agremiação, tem as letras de corrupção.

Após as boas vindas, vem a ala primeira. Chamada jeitinho brasileiro. Ligeira.
Certa malandragem na ginga, pode ser boa pinta, e ter requebrado. É fato.
A mansa fala. Mas isso não basta. A mão no bolso e então se inicia o rolo.

Debaixo das plumas, alguma trama. Cada dia mais gente chama, é lama.


Trazem depois então um rodopiante casal, aparentemente não vão mal.
Segurando a flâmula, dizem que aquilo é bandeira. Parece mais uma brincadeira.
Não tem propósito, só o ócio para o funcional. É destaque vestindo-se de animal.
Rugindo, rodando, pulando. O papo de cima pra baixo é o mesmo. Enrolando.

Como num desgovernado carrossel, a dança do interesse. Cobertos por um vel.
As baianas substituindo, essa ala vai evoluindo. A arte do esconder e desaparecer.
Além do mais, os olhos tapados. As bocas seladas. Os ouvidos cerrados.

Ninguém
vê, viu ou verá. Mas não pense que isso não é legal. É carnaval.

E assim vão permutando-se as aberrações. Trocando erros por populações.
A ala monocromática é a dos sem valores, de tão repugnante, sem cores.
Sem falar nas fantasias da exploração, do pecado, transviando a maldição.

Fazendo com que tudo pareça belo. Amarelo. A cor da desmoralização.
Apologia, libertinagem, sacanagem. Tudo confeccionado no alto escalão.
Que descendo, enfiam goela a baixo, forçadamente nos remendos do povão.
E há quem compraz, quando diante da urna singela, confirma esta depreciação.
E pra quem pensa que acabou a esquisitice, surge a ala dos que procuram um vice.

Logo depois vem a ala do cinema, retratando certos filhos da nação.
Também a do panetone, que por aclamação tornou-se de cada dia o nosso pão.
Os filhos das meias e das cuecas seguem logo atrás. É bacana, boçal. É voraz.

As fantasias se multiplicam. Meigas estrelas, foices e martelos. Tucanos singelos.

Desta forma pela avenida vai passando esse samba popular, essa estação batuqueira.
A bateria, carregada de ofensas. A paradinha, certeira ciência. Num ritmo sem fim.
Os destaques vão em cima, acenando para todos. Estranho é ser simples assim.
Finalizando com um bordão, uma foto, a ala do famoso aperto de mão. Acordão.

De pai para filho. A monarquia democrática. Molusco barbudo. Dama lunática.
Estes posam na última alegoria. Lá em cima, no ponto mais alto do pódio.
Não pense que rimarei com ódio. Mesmo cheirando à carniça, prefiro justiça.
Vai ver que tudo ainda muda. É pedir muito, crer na ilusão de uma ala chamada indignação.

Veja o que vai sobrando, o rastro. Um rabo de pavor, calor, sujeira. Tranqueira.
Para depois terminar em cinza. Nas quartas da vida, vida da plebe.
Terminemos, pois, da festa a transmissão, pelo canal da governamental concessão.
Para que o povo volte para suas vidas, pés sangrando, pão e circo, nas retinas sofridas.

Faltará então a apuração. Quesito por quesito, para que a festa se prolongue.
A nota final dependerá do jurado. Dependendo da dependência dele ser comprado.
Terminemos com o resultado, atentos ao grande fato que nos rodeia, questão trivial.
Vivemos todos os dias num eterno festival. Uma estupidez chamada carnaval.


Então vá se preparando. Nos próximos anos teremos ainda mais.
Se você não entrou na dança agora, não te deixarão de fora, jamais.

Dizem que essa é a hora, mas nada é valido, se não for a hora da paz.

Minha voz emudece aqui. Diante de tudo o que vi: É carnaval, meu caro!

Edvaldo Betioli Filho
Curitiba, 16 de fevereiro de 2010 - Dito carnaval

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A glorificação da mediocridade

Ordenação Episcopal Dom Julio Endi Akamine, SAC

Entrevista exclusiva: Mons. Julio Endi Akamine, SAC